quarta-feira, 25 de janeiro de 2017

Sobre a história da minha mãe, que perdeu toda a sua família aos 10 anos de idade

Era para ser só mais um feriado em família, mas não foi. Era para ser só mais um dia de verão, mas não foi. Era para ser só um banho de rio, mas definitivamente não foi. Aos 10 anos de idade minha mãe presenciou a morte por afogamento de toda a sua família, todos eles, mãe, pai e irmão se foram juntos, bem diante de seus olhos em um momento de lazer em um feriado em São Paulo. E exatamente hoje, 25 de janeiro de 2017, essa tragédia completa 40 anos. 

Obviamente que eu não conheci meus avós maternos. Não sei como eles eram, se a minha avó fazia bolo de fubá e hoje teria cabelos tingidos ou grisalhos. Será que ela costuraria vestidos bonitos para mim e para minha irmã ou nos divertiríamos indo ao cinema em uma tarde fria de quarta-feira? 

Também não pude conhecer o meu avô, ouvir histórias de quando ele era menino, colocar minhas bonecas para dormir em cima da barriga dele, nem passear de carro pelas ruas do interior. Talvez ele trouxesse pirulitos escondidas no bolso ou nos ensinaria a andar de bicicleta.  

Meu tio não passou em casa para me levar para tomar sorvete, não brincou de fazer cocegas, nem nos ensinou coisas que deixasse o meu pai de cabelo em pé. Não teve Natal, aniversários e sequer passamos um domingo reunidos na sala, em frente à televisão. E mesmo com tudo isso, com toda ausência de três vidas que fariam história na minha, eu não sofri. 

Não sofri porque quando abri os olhos nesse mundo tinha alguém que continuou vivendo mesmo depois de tanta dor. Não sofri porque logo ganhei uma irmã de alguém que resolveu refazer a sua vida, a sua família. Não sofri porque fui criada por alguém que nunca deixou a tristeza fazer morada em nossos corações. 

Não sofri porque sempre tive tudo aquilo que alguém gostaria de ter recebido na infância, mas precisou amadurecer mais rápido que as meninas de sua idade.  Não sofri porque alguém cuidou de tudo, o tempo todo, e com todo amor que um dia desejou receber quando ainda era só uma criança. 

O tempo passou e hoje continuo não sofrendo porque esse alguém se tornou avó do meu filho e está proporcionando a ele as melhores memórias de infância que ele poderia ter. As memórias que eu não tenho, aquelas que a gente guarda e conta por meio de fotos, histórias, lembranças. 

Às vezes educadora, outras comparsa, minha mãe não deixou que a vida a tornasse vítima eterna de um acontecimento que um dia fará sentindo para ela (e para todos nós). Mesmo com tudo que passou, continuou amável, amiga e companheira, pois escolheu continuar vivendo. 

Sem dúvidas ainda carrega em seu coração as cicatrizes daquele dia 25 de janeiro. Cicatrizes que às vezes doem e até sangram, mas sei que ela vive com a certeza de que seus pais estão muito orgulhosos dá família que ela construiu depois que eles se foram e ela assumiu a sua missão na Terra.  

Por isso, abrace as escolhas que Deus fez para você, sinta, chore e sofra, mas depois ame e dê amor para aqueles que existem na sua vida, como a minha mãe fez e fará para sempre. E caso esteja passando por um desses momentos que não dá vontade de levantar da cama, lembre-se: isso também passa! 

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